Já fazia anos que eu tinha morrido para os “vivos” da Terra. Vagava pelas ruas. Era, quase quatro horas da madrugada quando vi um motorista perder o controle do seu veículo que vinha em alta velocidade. Bateu frontal a um poste. Ante o violento impacto, o jovem, de uns dezoito anos, foi arremessado, varando o pára-brisa do carro. A rua estava deserta. Assustei-me, mas não sabia como agir. Tentei chegar perto. Vira ele, assustado, ingressar no mundo espiritual. Estava embriagado. Quase que imediatamente uma turba de espíritos que pareciam tão embriagados como ele, o envolveu levando-o com eles. Fiquei chocado. Agora algumas entidades, do grupo, se voltavam contra mim. Como fazia nestas ocasiões sai o mais rápido possível e rumei para uma casa bem próxima onde pude me esconder em uma garagem abandonada. Lá também havia espíritos. Alguns assustados outros tão revoltados e mergulhados em seu próprio drama.Não conseguiam perceber nada em sua volta. Vi uma senhora, também falecida, que chorava copiosamente. Gritava o nome de parentes. Um outro aparentando meia idade, que se mantinha mais equilibrado, me contou que ela estava assim, estacionada na sua própria dor, a mais de 50 anos. Já tinham estado ali seres mais evoluídos, porém nada puderam fazer por ela. Em sua encarnação, tinha sido uma pessoa de muitas posses e importante na sociedade. Cuidara, porém muito pouco de se preparar para vida espiritual. Lembrei-me de um trecho do evangelho que dizia que ao chegarmos a vida espiritual somos como um viajante que precisa ter na bagagem o que vai necessitar na viagem. Ela tinha passado mais de 70 anos na face da Terra e chegou de mãos vazias. Na sua ficha espiritual, fora à distribuição de algumas roupas que não mais usava, não tinha mais nada no capitulo da beneficência. Caridade sempre confundiu com dar pequenas esmolas de recursos que sobravam em sua bolsa. Tinha sido uma vida inteira voltada, principalmente, para seus interesses pessoais e cuidar e proteger a família. Ia a cerimônias religiosas, mas não participava com o coração. No fundo acreditava que após a morte não haveria mais nada. Tudo isso me penalizava e me fazia lembrar a minha encarnação que também fora marcada por muita importância pessoal e muita vaidade. Eu não tinha sido rico, mas mesmo participando da classe operaria não me preocupei muito com os outros. Cuidava de mim, da minha carreira e da minha família. Agora ali estávamos todos vagando pela crosta como desocupados e remoendo nosso passado. Quem sabe um dia conseguirei a oportunidade de renascer e ai então tentarei fazer tudo diferente. Essa era a única esperança que nos, seres que vagam pela crosta, esperam ansiosamente.
Relato mediúnico baseado no estudo da pergunta 995 do Livro dos Espíritos de Alan Kardec, disponível na Biblioteca Publica.
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