domingo, 16 de outubro de 2011

Momento Espirita - Superando a dor


 No dia 28 de julho de 1976, a cidade industrial de Tangshan foi
completamente arrasada por um terremoto apavorante. Trezentos mil
mortos.
O fato ficou famoso como símbolo do colapso total das comunicações
da China naquela época.
A preocupação das autoridades era com a crise pela morte de Mao
Tsé-Tung e duas outras importantes personalidades.
A notícia do terremoto acabou chegando ao governo através da
imprensa estrangeira.
Muitas mulheres ficaram sem marido e viram seus filhos desaparecer em
abismos profundos.
Chen foi uma delas. Naquela manhã de julho, antes de clarear, ela
foi despertada por um som estranho.
Era uma espécie de ronco surdo e um assobio, como se um trem
estivesse se espatifando contra as paredes da casa.
Quando ia gritar, metade do quarto cedeu e a cama onde estava deitado
o marido, foi tragada por um buraco enorme.
O quarto das crianças, que ficava do outro lado da casa, como um
cenário de um palco apareceu à sua frente.
O filho mais velho estava de olhos arregalados e boca aberta. A
menina chorava e gritava, estendendo os braços para a mãe.
O filhinho pequeno continuava dormindo calmamente.
A cena à sua frente sumiu de repente como se uma cortina tivesse
caído.
Chen acreditou que estava tendo um pesadelo e se beliscou. Não
acordou. Então, espetou a perna com uma tesoura.
Sentindo a dor e vendo o sangue, entendeu que não era um sonho.
Gritou como louca. Ninguém ouviu. De todos os lados vinham sons de
paredes desmoronando e de móveis quebrando.
Ela ficou ali, com a perna ensanguentada, olhando para o buraco
enorme que tinha sido a outra metade da sua casa.
Seu marido e suas lindas crianças tinham desaparecido diante dos
seus olhos.
Sentiu vontade de chorar, mas não tinha lágrimas. Simplesmente não
queria continuar vivendo.
Vinte anos depois, contando esta história a uma jornalista, Chen
confessa que quase todo dia, ao amanhecer, ouve um trem roncando e
apitando, junto com os gritos dos seus filhos.
Os pesadelos a machucam, mas ela diz que os suporta porque neles
estão também as vozes dos seus filhos.
E quem pensa que Chen vive somente a lamentar e a chorar a perda dos
seus amores, engana-se.
Ela, junto a outras mães que perderam seus filhos no terremoto de
1976, fundaram um orfanato, com o dinheiro da indenização que
receberam.
É um orfanato sem funcionários. Alguns o chamam de uma família sem
homens.
Vivem ali algumas mães e dezenas de crianças. Cada mãe ocupa um
aposento grande com cinco ou seis crianças.
Os aposentos do orfanato foram decorados com uma infinidade de cores,
de acordo com o gosto das crianças. Cada quarto com seu estilo de
decoração.
Bem diferente dos orfanatos tradicionais da China.
Ao ser questionada como se sente hoje, naquele voluntariado, confessa
Chen:
/Muito melhor. Especialmente à noite. Fico olhando enquanto as
crianças dormem. Sento ao lado delas, seguro suas mãos contra o meu
rosto. Beijo-as e agradeço a elas por me manterem viva./
/É um ciclo de amor. Dos velhos para os jovens e de volta para os
velhos/.
* * *
Por vezes, quando a dor nos visita, nos enclausuramos nela,
acreditando que a nossa é a dor maior do mundo.
O exemplo de Chen nos dá a dimensão da dor e nos ensina como lidar
com ela: atender o próximo que também sofre.
Afinal, sempre que olharmos para trás encontraremos criaturas mais
intensamente feridas do que nós mesmos. E no atendimento às suas
feridas, encontraremos o alívio que buscamos.
Tudo porque o toque delicado do amor é o curativo perfeito para as
próprias chagas abertas no coração.

/Redação do Momento Espírita com base no cap. /As mães que
sofreram um terremoto/, do //livro/As boas mulheres da China/, de
autoria de Xinran, ed. Companhia das letras./
--
Ricardo Severino
11 8729.8900 - 12 9144.5500 - 107*68104